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Cultura para todos: como tornar eventos culturais mais inclusivos para pessoas com TEA

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento que afeta a comunicação, a interação social e o comportamento, apresentando características que variam amplamente de pessoa para pessoa. De acordo com o Relatório de Vigilância de Autismo do CDC (Centers for Disease Control and Prevention). No Brasil, segundo o Censo do IBGE de 2022, 2,4 milhões de pessoas declararam ter recebido esse diagnóstico. Apesar de sua prevalência crescente, as pessoas autistas ainda enfrentam diversas barreiras em ambientes sociais e culturais, muitas delas relacionadas à falta de compreensão sobre suas necessidades sensoriais específicas. Neste artigo você vai ler:


Sessões adaptadas com menor estímulo sensorial são a indicação para a inclusão (Imagem IA mLabs)
Sessões adaptadas com menor estímulo sensorial são a indicação para a inclusão (Imagem IA mLabs)

O direito à cultura e o desafio da inclusão da pessoa com TEA


A arte e a cultura promovem a expressão e pertencimento entre diferentes grupos sociais, sendo fundamentais para uma sociedade democrática. No entanto, para muitas pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), o acesso pleno a eventos culturais ainda esbarra em barreiras invisíveis, mas profundamente impactantes: a falta de acessibilidade sensorial, a ausência de acolhimento adequado e o despreparo de muitos espaços públicos para lidar com a diversidade de funcionamento neurológico.


Segundo o CDC (Centers for Disease Control and Prevention), estima-se que 1 em cada 36 crianças esteja no espectro autista. No Brasil, segundo o Censo do IBGE de 2022, 2,4 milhões de pessoas declararam ter recebido esse diagnóstico. Apesar disso, os ambientes culturais ainda se mostram majoritariamente inadequados para acolher esse público. Se quisermos garantir o direito à cultura para todos, como prevê a Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/2015), é preciso ir além da acessibilidade física e investir também na acessibilidade sensorial e comunicacional.



Sensibilidades sensoriais: o maior obstáculo


Um dos principais desafios enfrentados por pessoas com TEA em eventos culturais é a sobrecarga sensorial. Isso ocorre porque muitos indivíduos autistas têm um sistema sensorial que percebe estímulos como som, luz, textura e cheiro de maneira amplificada ou atenuada. A hiper- ou hipossensibilidade pode tornar ambientes com som alto, luzes piscantes, aglomerações ou cheiros fortes em experiências extremamente desconfortáveis ou até insuportáveis.


Esse fenômeno é amplamente documentado em estudos como o publicado na Revista Ciências & Ideias (2025), que aponta que museus, teatros e centros de ciência frequentemente desconsideram essas particularidades, o que compromete a permanência e o aproveitamento do evento. A sobrecarga sensorial pode levar a crises de ansiedade, isolamento, colapsos, manifestações físicas e emocionais que ocorrem quando o cérebro não consegue mais processar o excesso de estímulos.



A importância da previsibilidade e do planejamento


Para muitas pessoas autistas, a previsibilidade é necessária para garantir segurança emocional. Eventos culturais que acontecem em locais desconhecidos, com horários incertos, mudanças súbitas de programação ou ausência de informações visuais e diretas podem gerar um alto nível de estresse. Por isso, é fundamental que os organizadores ofereçam materiais acessíveis com antecedência: mapas do espaço, cronogramas visuais, vídeos mostrando o ambiente, linguagem simples e recursos de apoio como pictogramas.


Essas estratégias não são difíceis de implementar e fazem uma enorme diferença. Como mostram diversas experiências internacionais e nacionais, a antecipação da experiência permite que o indivíduo autista se prepare emocionalmente para o evento e, com isso, tenha mais chances de permanecer e desfrutar da atividade com conforto.


Segundo Caetano e Pereira (2025), alguns trabalhos apontaram estratégias como visitas pré-agendadas, horários destinados às pessoas com TEA, equipes de funcionários com formação específica para o atendimento do público com TEA, além da preparação realizada pelos acompanhantes antes da visita.



Ambientes reguladores e ajustes sensoriais


Outro ponto a ser considerado é a criação de ambientes pensados para evitar ou aliviar a sobrecarga sensorial. Isso inclui, por exemplo, controle do volume de som, uso de iluminação indireta ou ajustável, oferta de fones abafadores de ruído e a eliminação de cheiros fortes no local. Além disso, é altamente recomendável que o evento disponha de um “espaço de regulação sensorial”: uma sala ou área tranquila, equipada com almofadas, brinquedos sensoriais, iluminação suave e, idealmente, profissionais treinados para oferecer suporte caso necessário.


Em festivais como o “Assim Vivemos” e atividades do Acessart do Instituto Lumiarte, essas medidas vêm sendo adotadas com sucesso. Lá, o público conta com sessões adaptadas com menor estímulo sensorial, além de legendas, intérpretes de Libras e audiodescrição. Essa abordagem torna o evento acessível e envia uma mensagem de acolhimento e pertencimento.



Comunicação acessível e equipe preparada


A comunicação também deve ser adaptada. Pessoas com autismo podem ter dificuldades com linguagem ambígua, instruções indiretas ou excesso de informações. Por isso, é importante que as orientações durante o evento sejam claras, visuais e objetivas. Instruções como “siga até o palco azul e aguarde no espaço indicado” são preferíveis a frases como “aguarde ali, que a gente chama”.


A capacitação da equipe do evento é igualmente essencial. Todos os envolvidos, recepcionistas, monitores, educadores, técnicos, devem estar preparados para lidar com comportamentos atípicos, reconhecer sinais de sobrecarga e agir com empatia e respeito. Infelizmente, ainda há muita desinformação e preconceito sobre o autismo, o que pode levar a situações constrangedoras ou excludentes. Com formação adequada, essas barreiras se reduzem significativamente.



Boas práticas que funcionam


Exemplos internacionais e nacionais mostram que eventos culturais acessíveis para pessoas autistas não só são possíveis, como bem-sucedidos. Na Finlândia, o projeto MusicTraces desenvolve oficinas que integram música e pintura em ambientes controlados, promovendo expressão artística e socialização entre autistas não verbais. No Brasil, além do Festival Assim Vivemos, alguns museus e centros culturais já oferecem horários exclusivos para famílias com autistas, com ajustes sensoriais e materiais educativos específicos.


Essas iniciativas mostram que a acessibilidade sensorial não reduz a qualidade da experiência artística, ao contrário, amplia seu alcance e impacto. Quando se pensa a cultura a partir da diversidade, criam-se eventos mais humanos, criativos e verdadeiramente representativos.



Incluir é transformar


Incluir pessoas autistas nos eventos culturais é mais do que uma questão de responsabilidade social: é um compromisso com a transformação do próprio fazer cultural. Trata-se de reconhecer que a diversidade neurológica também tem lugar na plateia, no palco, na criação. Trata-se de valorizar diferentes formas de sentir, perceber e se expressar.


Adaptar um evento não significa torná-lo menos atrativo para o público em geral, significa permitir que mais pessoas possam usufruí-lo. Significa garantir que ninguém precise escolher entre participar e se proteger. E significa também, em última instância, tornar nossa sociedade mais plural, sensível e justa.


O Instituto Lumiarte acredita que cultura é direito, é encontro, é linguagem de todos e isso só se realiza plenamente quando todos, de fato, podem estar presentes.


👉 Conheça mais acessando www.institutolumiarte.org.br ou entre em contato conosco pelas redes sociais.


 
 
 
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